Ao longo da minha experiência profissional como consultor de empresas na área de gestão de pessoas tenho me defrontado com inúmeras situações em que os profissionais que atuam em uma mesma área, divisão, departamento, gerência, vivem situações críticas que afetam profundamente os resultados esperados pela corporação, as metas não são atingidas plenamente e as relações interpessoais estão, de algum modo, abaladas.
Quando contratado para fazer uma intervenção no processo de desenvolvimento de equipes de trabalho, percebo muitas vezes, que o trabalho adquire contornos terapêuticos e, por que não dizer? acaba por assumir características de um processo alquímico.
Por que contornos terapêuticos? Porque conforme a etimologia da palavra grega therapeuein, que significa curar, o termo tem uma amplitude que transcende a cura dos males do corpo e atinge a própria alma, afetada por inúmeros males capazes de desagregá-la impedindo que se manifeste em sua plenitude. É um serviço à vida e nesse sentido é um serviço sagrado.
Assume características de um processo alquímico porque se trata de uma experiência de transformação. E nesse processo é possível identificar os elementos fragmentadores trazendo à luz o que está oculto. E, uma vez revelado, surge uma nova consciência fundadora de um novo modo de ser.
A transformação deve ocorrer nos indivíduos – membros do grupo, até que a consciência de interdependência se desenvolva e eles passem a se compreender como uma equipe. Diria que esse é um momento sagrado. E todos assim o compreendem quando a energia passa a ser sinergia.
Quando cada indivíduo toma consciência de si mesmo e se percebe simultaneamente como sujeito e objeto de transformação, ocorre o que é denominado como a unidade do opus alquímico. Através de exercícios pedagógicos (terapêuticos?!) os participantes do processo se dão conta que são, concomitantemente, sujeitos, matéria-prima e a própria obra que se busca.
Amplificando a reflexão sobre o processo que ocorre no indivíduo para um grupo de pessoas que se propõe a investir nas relações interpessoais para obter “qualidade de vida no trabalho” e busca de consciência dos seus papéis para fins de atingimento de metas e resultados corporativos, compreendo que o que está eminentemente em questão é a consciência de si mesmo como ser humano interagindo com outros e integrando seus valores e competências a serviço da coletividade, do bem comum.
Deste modo, não há outro caminho senão começar por conhecer a si mesmo. Compreender-se como ser humano, com seu sistema de crenças e valores, com sua Persona e Sombra atuando nas relações provocando conflitos internos e com seus semelhantes. Compreender-se a si mesmo também como um sujeito ardente de desejo de integração e realização.
Todos, de alguma maneira, participamos de uma dinâmica que nos transcende, pois também como consultor (terapeuta / alquimista) sou transformado, na medida em que participo com os demais, reflito e procuro dar significados à minha própria história..
Atuando nesse processo, tenho procurado resgatar os valores mais significativos da vida dos participantes através de exercícios de interiorização e meditação e, invariavelmente, emergem como o que dá sentido à vida valores como: fraternidade, solidariedade, amizade, cooperação, harmonia, geração de vida, amor, humildade, compreensão, companheirismo, respeito, justiça, família, e outros nesta mesma linha.
Na história de vida de cada um é possível constatar que os melhores momentos vividos, denominados momentos de plenitude, são aqueles marcados por valores éticos ou espirituais. Entretanto, marcados por condicionamentos e pela não consciência de si mesmo, suas relações interpessoais, são, em geral, afetadas por comportamentos individualistas, competitivos e recheados de atitudes não éticas.
Ao mobilizar os indivíduos em atividades de grupo, como jogos cooperativos, comumente são identificados comportamentos típicos de uma situação competitiva e, portanto, desagregadora. Assim, normalmente, eles se apresentam:
1. Com uma percepção de que atingir os seus próprios objetivos não é compatível com a obtenção dos objetivos dos demais;
2. Insensíveis às solicitações e necessidades dos outros;
3. Com reduzida capacidade de ajuda mútua;.
4. Alto índice de competição, fragmentação e individualismo e
5. Baixo nível de produtividade em termos qualitativos.
Ao realizar esse confronto cada um percebe as próprias contradições:
· Entre os valores afirmados de solidariedade, harmonia, companheirismo, etc e o desejo de dominar e humilhar o outro, procurando, muitas vezes, impedir que não atinja os seus objetivos ou alegrando-se quando isto ocorre; quando procura atingir os próprios objetivos às custas da derrota ou desvalorização do outro;
· Entre os valores de amor, cooperação e fraternidade e o individualismo destruidor, que pensa sempre primeiro em si em detrimento do bem comum. O objetivo está em vencer sozinho ou aperfeiçoar-se sem quaisquer referências ao desenvolvimento dos demais, porque não compartilha o saber, não ajuda o outro a crescer e nem aceita ajuda e críticas que contribuam para o próprio desenvolvimento etc.
Estas situações são geradoras de desmotivação, falta de confiança no grupo, ressentimentos, medos, baixo nível de conforto, de participação e criatividade porque não há espaço para a autenticidade e inteireza humanas.
É o momento do despertar para a mudança de estágio. Os participantes do processo tomando consciência de si mesmos são chamados a uma metanóia, a mudança de atitude onde prevaleça o conjunto de valores originais.
Todo o programa da (trans)formação de equipes se dá, essencialmente, através de atividades lúdicas, vivenciais e metáforas através das quais os participantes refletem sobre os seus comportamentos reais e desejados. Por meio de analogias, isto é, relacionando os aspectos vivenciados com o seu dia a dia eles tomam consciência de si.
As atividades, metáforas, jogos, são, na verdade, símbolos dos quais tratam a alquimia e a psicologia profunda.
A plena realização humana, a felicidade que passa pelo caminho do outro e o serviço como dádiva e instrumento para a construção de uma vida melhor, que passa por uma equipe, por uma empresa e sociedade melhores passa a ser a própria opus.
Em uma equipe de trabalho esse momento é caracterizado por comportamentos e atitudes de união e integração dos opostos, unidade na diversidade que pode ser expresso na sentença “Fazer a minha parte, em harmonia com os outros, para o bem de todos”.
Em Alquimia essa etapa recebe o nome de coniunctio e é o ápice da obra porque resulta da combinação dos opostos e anula a unilateralidade De onde se origina o próprio termo “pedra filosofal”, que sugere a união dos opostos: pedra que é concreto, realidade material e filosofia que é empreendimento espiritual, sabedoria. Uma vez conjugadas, pode-se pensar na realidade prática e eficaz da sabedoria e da consciência.
Quando em um jogo cooperativo, assim como na vida e no trabalho em equipe, todos os envolvidos têm um mesmo sentimento de vitória quando todos vencem e aprendem a se doar, a compartilhar, a confiar e aceitar as diferenças cria-se o senso de comunidade e de solidária com tal força que a equipe se torna imbatível.
Os valores espirituais – que dão sentido e plenitude à vida – se concretizam em gestos, atitudes, condutas que consubstanciam o verdadeiro espírito de equipe. Com este espírito é possível superar os conflitos, encontrar soluções criativas para os problemas que surgirem e atingirem as metas e resultados de forma significativamente melhor e mais participativa. O que rege e promove a adesão dos participantes não é mais somente os objetivos individuais, mas a harmonia entre os seus objetivos e o objetivo comum. Pode-se nomear este fenômeno como amor, que é o fundamento de todas as relações maduras.
E, se a alquimia é uma ciência que ensina como transformar todo tipo de metal em ouro, podemos, por analogia, afirmar que o processo de transformação de pessoas e grupos em indivíduos conscientes e equipes unidas de alto desempenho é um processo alquímico: sair do metal bruto para o ouro da equipe consciente!
Como afirma Fábio Brotto é o instinto de comunidade presente em todos os lugares da vida que deve mover os indivíduos.
O que importa é saber viver em comunidade, do contrário, quando não há consenso sobre a razão por que estamos reunidos, as instituições que criamos para nos servir tornam-se campos de batalha que não servem a ninguém. (...) Sem estarmos de acordo sobre o motivo para estarmos reunidos, nunca podemos desenvolver instituições que façam qualquer sentido: nosso instinto de comunidade nos leva a uma comunidade ‘minha’, e não a uma comunidade ‘nossa’.
Para conseguir isso [novas possibilidades], precisamos começar a conversar sobre propósitos e significados compartilhados e nos comprometermos com eles. À medida que permanecemos nessa conversa, começamos a trabalhar em conjunto em vez de tentarmos nos convencer, mutuamente, sobre quem está mais certo. Somos capazes de criar comunidades maravilhosas e vibrantes quando descobrimos os sonhos de possibilidades que compartilhamos.
E esse é um trabalho sagrado. Como é sagrada a opus alquímica. Por ela, todos somos transformados em ouro.
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